REURB: Conceito, Fundamento Legal e Modalidades (S e E)
- Edson Ferreira
- há 8 horas
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O fenômeno da urbanização brasileira trouxe consigo um desafio estrutural: a formação de núcleos urbanos informais, edificações construídas sem aprovação da municipalidade, loteamentos não registrados e ocupações em áreas de expansão urbana. O resultado foi a consolidação de bairros e prédios inteiros sem respaldo jurídico, privando milhares de famílias do acesso à segurança jurídica da propriedade e expondo-as a riscos urbanísticos e de segurança pública.
Nesse contexto surge a Regularização Fundiária Urbana (REURB), instituída pela Lei nº 13.465/2017 e regulamentada pelo Decreto nº 9.310/2018, como resposta do legislador à necessidade de integrar essas áreas ao ordenamento formal. Trata-se de um instrumento de política pública permanente, que alia o direito individual à moradia e à propriedade com o interesse coletivo na função social da cidade.
1. Conceito de REURB
De acordo com o art. 9º da Lei nº 13.465/2017, a REURB é o conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais destinadas à incorporação de núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano e à titulação de seus ocupantes.
Esse conceito demonstra sua natureza multidisciplinar:
· Jurídica, porque envolve a titulação dos ocupantes e a abertura de matrículas individualizadas no Registro de Imóveis;
· Urbanística, porque exige compatibilização com o Plano Diretor, zoneamento e diretrizes da política urbana;
· Ambiental, pois deve considerar o impacto sobre áreas de preservação, APPs e sustentabilidade do território;
· Social, porque garante inclusão e cidadania ao reconhecer juridicamente ocupações consolidadas.
Portanto, a REURB não é apenas uma ferramenta de registro, mas um processo de integração plena da informalidade à legalidade.
2. Fundamentos Constitucionais e Legais
A REURB se ancora em diversos dispositivos constitucionais e legais:
· Constituição Federal:
o Art. 6º: direito social à moradia;
o Art. 182: política urbana e função social da propriedade;
o Art. 225: direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
· Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001): reforça a necessidade de instrumentos para ordenar o pleno desenvolvimento da função social da cidade.
· Lei nº 13.465/2017: institui a REURB, definindo seus objetivos, modalidades, marco temporal e competências.
· Decreto nº 9.310/2018: regulamenta a lei, detalhando procedimentos administrativos e atribuições dos Municípios e Cartórios de Registro de Imóveis.
Esse conjunto normativo revela que a REURB é expressão da política urbana nacional, vinculando Municípios à sua aplicação, sem margem para alegar ausência de lei local como justificativa para omissão.
3. Modalidades da REURB
A lei distingue duas modalidades:
3.1. REURB-S (Interesse Social)
· Destinatários: população de baixa renda, em ocupações consolidadas e vulneráveis;
· Objetivo: promover inclusão social e garantir moradia digna;
· Benefícios: isenção de custas e emolumentos, maior flexibilidade urbanística.
Exemplo: comunidade de baixa renda ocupando há décadas área sem registro, em bairro periférico, sem infraestrutura básica.
3.2. REURB-E (Interesse Específico)
· Destinatários: empreendimentos privados de médio e alto padrão, inclusive em áreas nobres;
· Objetivo: conferir segurança jurídica e adequação urbanística a ocupações privadas;
· Custos: suportados pelos interessados, sem gratuidade.
Exemplo: prédio em Alphaville construído sem aprovação, ocupado por famílias de classe média, sem habite-se ou AVCB.
4. A Certidão de Regularização Fundiária (CRF)
O resultado da REURB é a emissão da CRF, expedida pela Prefeitura, que:
· reconhece a regularização urbanística e jurídica do núcleo;
· serve de título para registro no Cartório de Imóveis;
· possibilita a abertura de matrículas individualizadas das unidades;
· substitui, para todos os efeitos, o ato tradicional de instituição e especificação de condomínio.
A CRF, portanto, é o documento que transforma a realidade fática da ocupação em realidade jurídica, conferindo legitimidade plena à propriedade.
5. Importância da REURB na Sociedade
A REURB cumpre dupla função:
1. Social, ao assegurar o direito fundamental à moradia, evitando que famílias vivam à margem da legalidade.
2. Econômica e urbanística, ao valorizar imóveis, permitir acesso ao crédito, viabilizar tributos municipais (IPTU) e garantir a função social da cidade.
Além disso, a REURB reduz litígios judiciais e dá previsibilidade ao mercado imobiliário, evitando que prédios, loteamentos e bairros inteiros fiquem em situação irregular indefinidamente.
Conclusão
A REURB representa um marco jurídico na política urbana brasileira, ao oferecer instrumentos eficazes para a integração da informalidade. Seu conceito vai além do registro imobiliário, abarcando dimensões sociais, ambientais e urbanísticas.
Ao distinguir as modalidades REURB-S e REURB-E, a lei reconhece que tanto populações de baixa renda quanto empreendimentos privados de médio e alto padrão necessitam de regularização. A emissão da CRF é o ponto culminante do procedimento, garantindo segurança jurídica e promovendo a função social da propriedade.
Mais do que um processo administrativo, a REURB é um compromisso do Estado com a cidadania urbana, indispensável para assegurar o equilíbrio entre a expansão das cidades e a proteção dos direitos fundamentais.