top of page
logo ferreria

Sócio Oculto e Responsabilidade perante Terceiros: Análise Jurídica e Doutrinária da Figura do “Sócio de Fato”

  • Foto do escritor: Edson Ferreira
    Edson Ferreira
  • 5 de jun.
  • 4 min de leitura

Este artigo analisa a figura do sócio oculto — também denominado sócio de fato ou oculto de direito — à luz do ordenamento jurídico brasileiro, especialmente quanto à possibilidade de responsabilização patrimonial perante terceiros. Embora o Código Civil regule a constituição formal das sociedades, a realidade empresarial muitas vezes revela a existência de pessoas que, sem figurarem no contrato social, exercem poder de controle, gestão ou se beneficiam diretamente das atividades da sociedade. A análise aborda a relação entre o sócio oculto e a desconsideração da personalidade jurídica, bem como a jurisprudência que admite sua responsabilização direta em determinadas hipóteses.


A constituição de sociedades empresárias no Brasil obedece a critérios formais estabelecidos pelo Código Civil e pela legislação específica, especialmente quanto à identificação dos sócios no contrato social e no registro perante os órgãos competentes. Todavia, a prática empresarial revela situações em que pessoas não formalmente registradas exercem influência direta na administração ou na gestão da empresa — ou ainda, se beneficiam economicamente de suas atividades, sem assumir publicamente tal posição.


Esses indivíduos são comumente denominados “sócios ocultos” ou “sócios de fato”, cuja existência pode ter origem legítima (como nos casos de sócio investidor com cláusula de confidencialidade) ou fraudulenta, com a finalidade de ocultar patrimônio, evitar responsabilização ou impedir a execução judicial.


Este artigo analisa os limites legais da atuação do sócio oculto, os fundamentos jurídicos que permitem sua responsabilização perante terceiros e as hipóteses em que o Judiciário reconhece a extensão dos efeitos jurídicos da sociedade à sua figura.


2. Conceito e Caracterização do Sócio Oculto

O sócio oculto é aquele que não integra formalmente o contrato social, mas participa, direta ou indiretamente, da estrutura da sociedade, exercendo poder de gestão, comando, deliberação, ou se beneficiando financeiramente dos resultados sociais.


Exemplo de caracterização:

  • Atua como real controlador da empresa, embora terceiro conste formalmente como administrador;

  • Financia integralmente a sociedade e recebe os lucros “por fora”;

  • Determina estratégias comerciais ou operacionais sem poderes contratuais;

  • Utiliza a empresa como interposta pessoa jurídica, para ocultação de bens ou desvio de finalidade.


A atuação do sócio oculto pode, portanto, ser interpretada como simulação ou abuso da forma societária, o que autoriza a responsabilização patrimonial nos termos do art. 50 do Código Civil.


3. Fundamentos Legais para a Responsabilização

Embora a legislação brasileira não preveja expressamente a figura do sócio oculto, sua responsabilização decorre da conjugação dos seguintes fundamentos:


  • Art. 50 do Código Civil – Desconsideração da personalidade jurídica:


“Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir [...] que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.”


  • Art. 116 do Código Civil – Simulação:


“É nulo o negócio jurídico simulado, quando aparenta conferir ou transmitir direitos que não possui.”


  • Princípios da boa-fé objetiva, função social da empresa e vedação ao abuso de direito (arts. 421, 422 e 187 do CC).


A doutrina majoritária entende que o sócio oculto pode ser responsabilizado quando sua atuação se revela essencial à prática do ato ilícito, ou quando se beneficia diretamente da fraude contra terceiros.


4. Jurisprudência sobre o Tema

“É possível responsabilizar o sócio oculto que, embora não formalmente registrado, se beneficia das atividades da empresa, inclusive em prejuízo de terceiros, caracterizando-se abuso da forma societária.” (STJ, REsp 1.790.874/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 21/08/2019)


“A interposição de pessoas, com ocultação do real sócio, constitui hipótese de simulação e fraude, justificando a desconsideração da personalidade jurídica para alcançar o patrimônio do sócio de fato.” (TJSP, Ap. Cív. 1009874-23.2022.8.26.0100, j. 18/10/2023)


“A responsabilização do sócio oculto não exige, necessariamente, a desconsideração formal da personalidade jurídica, quando demonstrada sua atuação direta e dolosa na prática do ilícito.”(TRF4, Ap. Cív. 5005210-39.2019.4.04.7100, j. 09/05/2023)


5. Distinção entre Sócio Oculto Legítimo e Sócio Oculto Fraudulento

É necessário distinguir duas situações distintas:

Sócio oculto legítimo:

  • Parte de um arranjo contratual lícito (ex: contrato de investimento, fiduciário ou memorando de confidencialidade);

  • Atua sem gerência ou controle direto;

  • Não pratica atos lesivos nem visa ocultar patrimônio.


Sócio oculto fraudulento:

  • Atua com objetivo de fraudar credores ou mascarar controle patrimonial;

  • Pratica atos administrativos sem estar investido formalmente;

  • Beneficia-se indevidamente da sociedade sem responder por obrigações.


A responsabilização decorre da finalidade e dos efeitos práticos da atuação do sócio oculto, sendo admissível sua inclusão no polo passivo da demanda quando evidenciado o caráter simulador ou lesivo da conduta.


6. Meios de Prova e Procedimento Processual

Para responsabilizar o sócio oculto, é essencial demonstrar:


  • Atuação direta na empresa (assinatura de contratos, e-mails, gestão de contas);

  • Participação nos lucros sem vínculo formal;

  • Interposição fraudulenta de pessoas para ocultar titularidade;

  • Confusão patrimonial com a pessoa jurídica.


A responsabilização pode ocorrer:


  • Via Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ), quando a empresa é parte no processo (arts. 133 a 137 do CPC);


  • Ou por inclusão direta no polo passivo, se a responsabilidade for objetiva e comprovada por conduta dolosa.


7. Considerações Finais

A figura do sócio oculto representa um desafio prático e teórico ao direito societário brasileiro. Embora o contrato social seja o instrumento formal de constituição da sociedade, a realidade empresarial demonstra que a aparência pode ser manipulada com fins de fraude, ocultação patrimonial ou fuga de responsabilidade.


A responsabilização do sócio oculto deve observar critérios objetivos de prova, com base em atos de gestão, benefício econômico e atuação dolosa. Quando evidenciado o abuso da forma societária, é legítima sua inclusão no polo passivo das ações cíveis ou executivas, com fundamento nos princípios da boa-fé, função social e repressão à fraude.


A atuação preventiva — por meio de contratos bem estruturados, governança societária transparente e contabilidade regular — é essencial para evitar a caracterização indevida de sócio oculto e proteger todos os envolvidos de litígios e exposições patrimoniais indevidas.

 
 
logo ferreria

Localização

Escritório em Alphaville, Barueri/SP - Alameda Grajaú, 614, conjs. 1409/1410 - CEP. 06454-050

Atendimento em todo o Brasil

Telefone

(11) 4198-8103
(11) 98447-3703

  • Facebook
  • LinkedIn
  • Instagram
  • YouTube

Ferreira Advocacia 2025 © Todos os direitos reservados | Desenvolvido por Velo XP

bottom of page