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Foto do escritorEdson Ferreira

Riscos Jurídicos em Parcerias Imobiliárias: A Proteção ao Comprador e a Responsabilidade da Construtora em Casos de Hipoteca e Penhora


As parcerias imobiliárias entre construtoras e proprietários de terrenos são amplamente utilizadas no Brasil como um meio de viabilizar a construção de empreendimentos, otimizando o uso da propriedade e garantindo lucro para ambas as partes. Contudo, tais arranjos podem apresentar uma série de riscos para terceiros que adquirem imóveis "na planta".


O problema torna-se ainda mais grave quando a construtora, para financiar a obra, oferece o terreno e o empreendimento em construção como garantia hipotecária junto a instituições financeiras, ou quando está envolvida em disputas judiciais que culminam em penhoras sobre o bem.


Neste artigo, propõe-se uma reflexão ampla sobre os riscos jurídicos enfrentados pelos compradores em tais cenários, os direitos assegurados pela legislação e jurisprudência, e as responsabilidades da construtora em garantir a regularização dos imóveis. A análise será pautada por uma abordagem legal e jurisprudencial, especialmente à luz da Súmula 308 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que protege o comprador contra hipotecas constituídas pela construtora.

 

1. O Contexto da Parceria Imobiliária e os Riscos ao Comprador


Em uma parceria imobiliária, o proprietário do terreno cede sua propriedade à construtora, que se responsabiliza por desenvolver o projeto, aprová-lo perante as autoridades competentes, realizar a construção e comercializar as unidades. A construtora, por sua vez, muitas vezes necessita de recursos financeiros para a execução da obra e recorre a empréstimos bancários, oferecendo o terreno e o empreendimento em construção como garantia de financiamento.


No caso exposto, a construtora não apenas deu o terreno e a obra em garantia hipotecária, mas também foi alvo de ações cíveis e trabalhistas que resultaram em penhoras sobre o imóvel. Esse cenário gera uma série de complicações para o comprador, que, mesmo após quitar integralmente o valor da unidade adquirida, não consegue obter a regularização da propriedade em razão dos gravames inscritos na matrícula do imóvel. O comprador, neste caso, encontra-se em uma posição vulnerável, uma vez que o imóvel está comprometido por dívidas da construtora com terceiros, das quais ele não participou.


2. A Proteção ao Comprador de Boa-Fé: A Súmula 308 do STJ


O ordenamento jurídico brasileiro, ciente dos riscos inerentes à compra de imóveis na planta, prevê mecanismos de proteção ao adquirente de boa-fé. A principal referência nesse sentido é a Súmula 308 do STJ, que dispõe:


"A hipoteca firmada entre a construtora e a instituição financeira, anterior ou posterior ao compromisso de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes dos respectivos imóveis."


Essa súmula tem por objetivo proteger o comprador contra o ônus de hipotecas firmadas entre a construtora e instituições financeiras, garantindo que o imóvel seja entregue livre de tais gravames após a quitação. Na prática, significa que a hipoteca não pode ser oposta ao comprador, que tem o direito de receber a propriedade livre de ônus, independentemente de acordos firmados pela construtora com terceiros.


No entanto, a aplicação prática dessa proteção nem sempre é imediata. No caso específico, embora o comprador tenha quitado integralmente o valor do imóvel, a construtora alega dificuldades para remover a hipoteca, justificando que depende de autorização da instituição financeira. Além disso, as penhoras decorrentes de outras ações judiciais contra a construtora complicaram ainda mais a situação.


3. As Responsabilidades da Construtora e Medidas Cabíveis


A construtora, ao firmar contratos de compra e venda com terceiros, assume a responsabilidade de entregar os imóveis livres de quaisquer ônus. Isso inclui a obrigação de remover hipotecas e penhoras que afetem as unidades adquiridas. No entanto, em muitos casos, as construtoras enfrentam dificuldades financeiras que comprometem a regularização das propriedades e expõem os compradores a riscos significativos.


No caso em tese, o comprador ingressar com uma ação de obrigação de fazer, requerendo judicialmente a remoção dos gravames que impede a regularização do imóvel. Mesmo com multa diária (astreintes) pelo descumprimento da obrigação, e forçar o cumprimento da decisão. Contudo, muita das vezes são inócuas.


Frente à inércia da construtora, o comprador, ainda, pode busca outras medidas, como o pedido de falência da construtora, o que poderia levar à liquidação de seus bens e ao pagamento dos credores, incluindo o próprio comprador. Embora a construtora consiga evitar a falência ao pagar as multas aplicadas, a regularização do imóvel continua pendente, alegando crise financeira.


4. Riscos e Garantias ao Comprador: A Boa-Fé e as Penhoras de Terceiros


Outro aspecto relevante do caso é a penhora decorrente de ações judiciais cíveis e trabalhistas movidas contra a construtora. Embora o comprador não tenha relação direta com essas dívidas, o imóvel que adquiriu acabou sendo atingido por tais medidas, o que é uma situação comum em empresas que enfrentam múltiplas demandas judiciais.


Nesse ponto, o comprador pode utilizar o embargo de terceiros como instrumento para buscar a exclusão da penhora, demonstrando que adquiriu o bem de boa-fé e que este não pode ser atingido por dívidas da construtora. Além disso, pode pleitear indenização por danos materiais e morais decorrentes da demora na regularização do imóvel.


A boa-fé do comprador, garantida pela Súmula 308 do STJ, é um fator essencial para sua proteção jurídica, mas, na prática, a efetivação de seus direitos depende de ações judiciais e da capacidade financeira da construtora em resolver seus passivos, o que, muitas vezes, acaba prolongando o litígio.


Conclusão


A complexidade das transações imobiliárias envolvendo parcerias entre construtora e proprietário de terreno, bem como a importância de uma gestão financeira e jurídica adequada para evitar que compradores de boa-fé sejam prejudicados por dívidas e obrigações da construtora. Embora a Súmula 308 do STJ ofereça proteção importante, sua aplicação prática pode encontrar barreiras quando há múltiplos gravames sobre o imóvel, exigindo uma atuação judicial mais agressiva por parte dos compradores.


É crucial que o comprador, antes de adquirir um imóvel na planta, investigue detalhadamente a situação financeira da construtora, verifique a existência de hipotecas e outras garantias e, se necessário, inclua cláusulas contratuais que ofereçam maior segurança quanto à regularização do bem após a quitação. No âmbito judicial, medidas como a ação de obrigação de fazer, embargos de terceiros e o pedido de indenização são ferramentas que podem auxiliar o comprador na defesa de seus direitos.


A responsabilidade da construtora é clara: entregar o imóvel livre de ônus. Quando isso não ocorre, o comprador tem direito à reparação e à plena regularização de sua propriedade.

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