Responsabilidade dos Administradores por Omissão em Casos de Insolvência Empresarial: Dever de Diligência e Dever de Preservação do Patrimônio Social
- Edson Ferreira
- 1 de jul.
- 3 min de leitura

Este artigo examina a responsabilidade dos administradores por omissão no exercício de suas funções durante a iminência ou constatação da insolvência empresarial. A partir dos deveres de diligência, lealdade e preservação do interesse social previstos no Código Civil, o estudo aborda as consequências jurídicas da inércia gerencial frente à deterioração econômica da sociedade, incluindo responsabilização civil e penal por omissão dolosa ou negligente. Analisa-se, ainda, a jurisprudência relativa à omissão na adoção de medidas de proteção patrimonial, no pedido tempestivo de recuperação judicial ou na comunicação regular aos credores.
O administrador ocupa papel central na condução dos negócios da sociedade empresária, devendo agir conforme os princípios da boa administração, interesse social e preservação da empresa. Em contextos de crise econômico-financeira, esse dever assume contornos ainda mais relevantes, uma vez que a conduta omissiva pode agravar a situação da companhia e prejudicar credores, empregados e demais stakeholders.
O presente artigo propõe a análise da responsabilidade do administrador não apenas por atos comissivos (ex: fraude, má gestão deliberada), mas sobretudo pela omissão injustificada diante de cenários de insolvência, com foco nos limites objetivos do dever de diligência e nas consequências civis e penais da inação.
2. Dever de Diligência do Administrador na Legislação Brasileira
2.1 Fundamento no Código Civil
Art. 1.011, § 1º – O administrador deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios.
Este dispositivo estabelece o dever objetivo de diligência, que compreende:
Monitoramento contínuo das finanças da empresa;
Adoção de medidas para prevenir insolvência;
Comunicação transparente a sócios e credores;
Busca de alternativas legais para preservação da empresa (ex: recuperação judicial ou extrajudicial, renegociação).
A omissão ou a postergação injustificada dessas medidas pode configurar gestão temerária ou culposa.
3. Omissão e Configuração da Responsabilidade Civil e Penal
3.1 Responsabilidade civil
A omissão do administrador pode gerar responsabilidade por perdas e danos quando:
Não adota medidas razoáveis para evitar agravamento da crise;
Mantém aparente normalidade enquanto acumula passivos ocultos;
Deixa de comunicar o quadro de insolvência a sócios e credores.
“Responde o administrador que, diante da evidente situação de insolvência, se omite quanto à adoção de medidas legais cabíveis, agravando a exposição dos credores.” (TJSP, Ap. Cív. 1044520-39.2021.8.26.0100, j. 15/08/2023)
3.2 Responsabilidade penal
A Lei de Falência e Recuperação Judicial (Lei nº 11.101/2005) prevê sanções penais por omissão dolosa ou culposa de administrador:
Art. 168, I – É crime falimentar a omissão no pedido de falência ou recuperação quando evidente o estado de insolvência, com prejuízo a terceiros.
Pena: reclusão de 2 a 6 anos, além de multa.
4. Dever de Preservação do Patrimônio Social e de Mitigação de Danos
O administrador tem o dever de adotar medidas eficazes para evitar o agravamento da crise empresarial, tais como:
Renegociar contratos com fornecedores e credores;
Suspender novas contratações ou investimentos de risco;
Iniciar processo de recuperação judicial ou extrajudicial tempestivamente;
Propor aporte de capital, redução societária ou venda de ativos excedentes;
Encerrar atividades de forma ordenada, se inexequível a continuidade.
A omissão frente a essas obrigações pode levar à quebra do nexo de confiança entre a administração e os demais envolvidos, autorizando inclusive a exclusão do administrador da sociedade, sua inabilitação empresarial e responsabilização pessoal.
5. Jurisprudência sobre Omissão do Administrador em Crise Empresarial
“A omissão do administrador em comunicar tempestivamente a situação falimentar da empresa, mantendo a aparência de normalidade, configura infração à boa-fé e enseja responsabilização solidária por dívidas contraídas no período.” (STJ, REsp 1.812.501/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 12/09/2022)
“É irregular a conduta do gestor que se mantém inerte diante da deterioração do fluxo de caixa, postergando providências legais em prejuízo de terceiros.” (TJMG, Ap. Cív. 1.0024.18.320521-0/001, j. 19/04/2023)
“A gestão passiva e negligente, diante de situação de pré-insolvência, é suficiente para configurar má administração e justificar a desconsideração da personalidade jurídica.” (TJSP, Ap. Cív. 1038711-77.2020.8.26.0100, j. 22/11/2022)
6. Boas Práticas para Administração em Cenário de Crise
Analisar periodicamente os indicadores financeiros e contábeis;
Buscar assessoria especializada em reestruturação empresarial e renegociação;
Notificar os sócios e demais administradores sobre riscos iminentes;
Documentar decisões e justificar alternativas escolhidas;
Não contrair novas obrigações em nome da empresa sem viabilidade real de adimplemento;
Avaliar tempestivamente a viabilidade de recuperação judicial ou dissolução ordenada.
7. Considerações Finais
O administrador não responde apenas por atos de má-fé ou fraudes deliberadas, mas também por condutas omissas que, diante da deterioração econômica da empresa, representem inércia injustificada e gestão antieconômica.
A legislação civil e falimentar impõe deveres objetivos de diligência e de preservação do patrimônio social, que, se descumpridos, autorizam a responsabilização patrimonial, pessoal e, em casos mais graves, penal.
A atuação responsável e transparente diante da insolvência empresarial é não apenas um dever jurídico, mas uma exigência ética de quem ocupa posição de comando dentro da sociedade empresária.