Quem responde se a holding for desconsiderada?
- Edson Ferreira
- há 1 dia
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A constituição de holdings tem se tornado cada vez mais comum como estratégia de organização patrimonial, sucessória e empresarial. Contudo, apesar de sua aparente blindagem jurídica, a holding pode ser alvo de desconsideração da personalidade jurídica, especialmente em contextos de abuso de forma societária, desvio de finalidade ou confusão patrimonial.
Neste artigo, abordamos quem responde, na prática, caso uma holding seja desconsiderada, quais os fundamentos legais e jurisprudenciais para essa medida e quais cuidados os empresários devem adotar para proteger o patrimônio familiar ou empresarial envolvido.
1. O que é uma holding e por que é utilizada
A holding é uma sociedade que tem por finalidade principal a participação no capital de outras empresas, podendo ser do tipo pura (quando apenas administra participações) ou mista (quando também exerce atividade operacional). No contexto brasileiro, é frequentemente utilizada para:
· Planejamento sucessório e redução de conflitos familiares;
· Estruturação de grupos empresariais com maior eficiência tributária;
· Proteção patrimonial, segregando ativos em pessoa jurídica distinta da física;
· Organização contábil e financeira do patrimônio familiar ou empresarial.
2. Quando a holding pode ser desconsiderada
A desconsideração da personalidade jurídica, prevista no art. 50 do Código Civil, é aplicada quando a pessoa jurídica é utilizada para:
· Fraude ou abuso de direito;
· Confusão patrimonial entre sócios e a empresa;
· Desvio de finalidade (uso da empresa para fins distintos dos declarados);
· Blindagem indevida de bens, com intuito de fraudar credores.
A jurisprudência brasileira também admite a desconsideração inversa — quando o patrimônio da holding é atingido para satisfazer dívidas dos sócios — ou expansiva, envolvendo empresas de um mesmo grupo familiar ou econômico.
3. Quem pode ser responsabilizado se a holding for desconsiderada
Quando o juiz afasta a autonomia da holding, os bens de seus sócios, controladores ou administradores podem ser diretamente atingidos. As principais hipóteses são:
➤ Sócios da holding (pessoa física ou jurídica):
Caso tenha havido desvio de finalidade ou confusão patrimonial, os bens pessoais dos sócios podem ser penhorados para saldar dívidas contraídas pela holding ou mesmo por empresas controladas por ela.
➤ Administradores de fato ou de direito:
Se restar comprovado que agiram com dolo, fraude ou má gestão, os administradores podem responder pessoalmente, inclusive com responsabilidade solidária.
➤ Demais empresas do grupo (responsabilidade cruzada):
Na hipótese de atuação conjunta ou grupo econômico de fato, os bens de empresas coligadas ou do mesmo grupo familiar também podem ser atingidos.
Importante: A desconsideração não significa extinção da pessoa jurídica da holding, mas sim o afastamento momentâneo de sua autonomia patrimonial para atingir diretamente os bens de seus integrantes.
4. Jurisprudência atual e critérios dos tribunais
Os tribunais têm aplicado a desconsideração com base em critérios objetivos e fáticos. A mera constituição de uma holding não é abusiva por si só, mas se utilizada como instrumento para fraudar credores ou esconder patrimônio, poderá ser afastada judicialmente.
“A constituição de holding familiar, por si só, não configura fraude, sendo imprescindível a demonstração de desvio de finalidade ou confusão patrimonial para a aplicação do art. 50 do CC.” (STJ – REsp 1.775.269/SP)
“Verificada a confusão patrimonial e a administração conjunta, admite-se a desconsideração da personalidade jurídica da holding, com responsabilização dos sócios e demais empresas do grupo.” (TJSP – Agravo de Instrumento 2153451-71.2020.8.26.0000)
5. Como prevenir a desconsideração: práticas recomendadas
Para reduzir os riscos de responsabilização pessoal ou familiar decorrente da desconsideração da holding, é fundamental adotar boas práticas de governança e controle:
· Segregação clara entre o patrimônio da holding e de seus sócios;
· Contabilidade regular e individualizada, sem mistura de recursos;
· Definição formal de poderes e atribuições dos administradores;
· Respeito ao objeto social e às finalidades declaradas da empresa;
· Não utilização da holding para esconder bens ou fraudar obrigações;
· Realização de atos societários regulares, com registros atualizados;
· Assessoria jurídica e contábil permanente para auditoria e compliance.
6. Considerações finais
A holding é uma estrutura lícita, eficaz e recomendada para organização patrimonial e sucessória, desde que utilizada com boa-fé, transparência e rigor técnico. Contudo, quando empregada de forma distorcida, pode ser alvo da desconsideração da personalidade jurídica, expondo sócios, administradores e empresas do grupo a responsabilidade direta por dívidas.
O empresário deve compreender que a forma não protege o conteúdo ilícito: nenhuma estrutura societária resistirá à prova de abuso. Por isso, a atuação preventiva é sempre o melhor caminho para preservar o patrimônio construído com esforço, respeitando os limites legais e contratuais aplicáveis.